Os donos de postos de combustíveis prometeram, na tarde de ontem, abrir a contabilidade de seus estabelecimentos para o inquérito civil em curso no Ministério Público Estadual. O acerto foi realizado entre o promotor de Defesa do Consumidor, José Augusto Peres, e o presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes (Fecombustíveis), Paulo Miranda. A intenção da categoria, segundo o próprio Paulo Miranda, é dar mais transparência à composição do preço da gasolina.
A presença de Paulo Miranda em Natal serve justamente para tentar acalmar os ânimos, após a crise entre consumidores e postos de gasolina nos últimos dias. Protestos, mobilização no twitter e parcerias com entidades públicas, como o Procon, o Ministério Público e a Prefeitura de Natal, provocaram uma queda nos preços. Contudo, grande parcela dos consumidores, e as mesmas entidades, ainda colocam em dúvida as justificativas dadas pelos revendedores para o aumento de preços. O presidente da Fecombustíveis irá justamente tentar “dar mais tranqüilidade e transparência a essa discussão”.
Um dos primeiros passos para isso é a abertura da contabilidade, prometida pelo próprio Paulo Miranda. A divergência principal é quanto à margem de lucro dos postos: consumidores e Procon acreditam que o aumento do preço é um reflexo do suposto aumento do lucro dos comerciantes, enquanto que os revendedores afirmam ser uma conseqüência de contingências no mercado de combustíveis. Com os dados contábeis em mãos, e uma perícia contratada pelo Ministério Público, José Augusto Peres poderá esclarecer de vez a questão. “Queremos abrir a nossa contabilidade para agilizar o processo, antes que o promotor peça isso judicialmente”, diz Paulo Miranda.
O presidente da Fecombustíveis reafirma a “normalidade” do preço praticado em Natal. “O grande vilão é o álcool anidro”, disse, acrescentando que a Federação apóia o investimento brasileiro no mercado de etanol, mas faz ressalvas quanto ao crescimento do setor. “O etanol, que significa 25% da mistura da gasolina tipo C, custava pouco mais de 80 centavos no ano passado e hoje custa R$ 2,47”, compara. Nessa perspectiva, o aumento do combustível em Natal e, segundo Paulo Miranda, em outros locais do Brasil é devido ao preço do etanol.
A análise do presidente da Fecombustíveis aponta para o pouco crescimento na produção do etanol como o estopim para a crise. Paulo Miranda conta que o consumo de combustíveis cresceu 11% em 2010, enquanto a indústria de etanol cresceu apenas 2%. “O país não está conseguindo acompanhar e por isso foi necessário importar álcool de milho dos Estados Unidos. Nesse meio tempo, o preço subiu”, relata.
Por essas contingências, Paulo Miranda qualifica o movimento “Combustível Mais Barato Já” como “injusto” e disse temer o acirramento dos ânimos. “A minha chegada aqui é uma tentativa de dar mais serenidade, porque a discussão está muito emocional, muito acirrada. Sinceramente, temi por algum ato mais radical”, encerra.
Empresário lamenta interdição de posto
Para o proprietário Beto Santos, a interdição do Posto II da Hermes da Fonseca, no último sábado, foi ocasionada principalmente pelo “calor do momento” no mercado de combustíveis. Em uma fiscalização da Agência Nacional de Derivados de petróleo (ANP), ficou constatada a proporção de 21% de álcool na Gasolina aditivada tipo C, quando o teor fixado pela lei é de 25%. Segundo Beto Santos, a interdição do posto como um todo foi um exagero, ocasionado pela turbulência do atual momento.
Na visão do empresário, a ANP deveria ter interditado somente a venda de gasolina aditivada, tendo em vista que os demais combustíveis estavam de acordo com o padrão. “Não entendo porque interditar o posto como um todo, quando em todos os outros produtos não havia problema.”
Com a proporção de 21% de álcool na mistura com a gasolina, o consumidor, segundo Beto Santos, tem um combustível “mais puro”. “Levando a lei ao pé da letra, realmente está fora do padrão, mas não pode se falar em combustível adulterado. A gasolina estava mais pura que o normal, ou seja não havia prejuízo ao consumidor”, diz.
Zona Norte tem gasolina mais barata
A queda nos preços da gasolina e do etanol foi verificada em todos os pontos da cidade. Segundo levantamento inicial do Procon, a média dos preços na Zona Sul de Natal está em R$ 2,85, contra os R$ 2,99 anteriormente cobrados. Na Zona Norte, o posto do Carrefour está vendendo o litro a R$ 2,72, o preço mais baixo da cidade, ainda segundo o Procon. O litro mais caro está custando R$ 2,88, em postos da Zona Sul da cidade. O levantamento foi iniciado ontem e deve ser finalizado hoje.
Para o diretor do Procon, Arakem Farias, a diminuição dos preços é uma resposta ao movimento popular de boicote aos postos de combustíveis e ao trabalho dos órgãos públicos. “É uma resposta ao esforço da sociedade. Seria bom se fizéssemos o mesmo com outros temas polêmicas, como fila de banco e preço da passagem de ônibus”, afirma. Contudo, para Arakem, o trabalho não deve ser finalizado após a baixa dos preços. “Pelo contrário, devemos intensificar as ações após o feriado da semana santa”.
O Procon notificou desde a última semana 35 postos, por suspeita de prática de preços abusivos. A notificação não significa uma multa, porque ainda há espaço para a defesa dos revendedores. “Um aumento sem justificativa fere o artigo 12 do código do consumidor, então esses revendedores precisam dar uma justificativa plausível para esse aumento. Ao longo da próxima semana, iremos intensificar esse trabalho”, diz Arakem Farias.
Para o diretor do Procon, a prática abusiva é aparente. “O aumento do ICMS significa R$ 0,05 do preço. E comprovamos não haver aumento nas distribuidoras, então não há justificativa até então. Mas repito: os revendedores têm espaço para se defender”, aponta. E encerra: “A própria diminuição do preço é uma evidência de que havia uma gordura nessa margem de lucro”.
bate-papo - » Beto Santos diretor do Sindipostos
Os combustíveis estão mais baratos?
Nos cinco postos da nossa rede, os preços estão mais baixos. Entre R$ 2,82 e R$ 2,85, enquanto antes estavam entre R$ 2,95 e R$ 2,99.
Os preços são diferentes?
Sim, porque os postos têm custos diferentes. Não se pode comparar um posto na Roberto Freire, onde o metro quadrado é caro, com um nas Quintas, onde o metro quadrado é mais barato. Além disso, os postos têm estruturas diferentes e alguns são mais caros de manter.
A que se deve a diminuição dos preços?
Com certeza por conta da mediação da Prefeitura.
No que influenciou?
Além de ter um discurso mais racional, a prefeita prometeu agilizar o licenciamento ambiental dos postos de combustíveis. Esse é um problema sério, porque a falta de licença favorece os empresários que não querem trabalhar de acordo com a lei. É preciso diferenciar o empresário do ramo de combustíveis do “posteiro”, que não tem compromisso nenhum.
Essa diminuição foi retirada da margem de lucro do posto?
Sim, da margem de lucro e por conta da diminuição do preço nas distribuidoras.